sábado, 19 de dezembro de 2009

Em trânsito

Uma chuva fininha caía sobre a cidade. As luzes de freio dos automóveis lembravam o período em que, ajoelhada no banco de trás do carro de seu padrinho, era levada para Guarujá pela Piaçaguera, sem ver o mar.
Anos depois, olhava sempre pelas janelas do lado do motorista. Ela nunca sentava do lado oposto ao dele. Não quando podia escolher. O barulho do parabrisa incomodava, mas o sorriso e o chapéu de Sérgio Reis estampados em um cartaz colado ao vidro eram ainda mais incovenientes.
O ônibus era tão familiar para quem não gostava de dirigir. Era possível ler antes de chegar em casa. A casa era cama; ou o sofá pequeno onde, encolhida, sentia-se abraçada, querida.
A vida não andava sendo justa. Os seus planos eram concluídos, os amores esquecidos. Restavam o ócio e a imaginação. A novela que escrevia em pensamento todas as noites sustentavam sorrisos do marido Pedro e a sensação de acariciar a barriga de oito meses. Por mais que não trabalhasse para, o objetivo era o amor, os filhos, o compartilhamento de cada dia. Era isso que ela queria tomando ônibus atrás de ônibus, todos os dias.

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